sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Quarto-crescente


A bem da verdade, já não era sexta-feira e sim, madrugada de sábado. Fazia calor, o rio exalava um cheiro acre, e naquele bar, onde quase todos se conheciam, ele, que a poucos conhecia, tocava.
Não era bonito. Camisa em desalinho, sem gravata, calça social, sapato horrível, paletó esquecido numa cadeira qualquer. Viera de um casamento. E tocava como um deus. Um deus tropical, trôpego e lascivo, com olhos de anjo, boca e mãos de cafajeste.
À saída, beijou-a sem pedir licença. Longamente. A ela, que não o conhecia. Depois, olhou-a nos olhos e disse que tanto a esperara. Ela riu. Conversa fiada, pensou. Nada disse. Deixou que a beijasse de novo antes de partir.
Amanhecera. O calor aumentara. O hálito do rio sossegara. Os amigos se entreolhavam. Ninguém entendera nada. Nem ela. Mas os dias nunca mais foram banais como antes.



Márcia Maia


4 comentários:

Ricardo Mainieri disse...

O amor não pede licença e teu conterrâneo João Cabral já dizia que não tinhamos guarda-chuvas contra ele..
O inesperado se fez presente e virou uma paixão sem os freios da racionalidade.
Miniconto para ler ao som de The Art of Ballads, de Dexter Gordon...

Beijão.

Ricardo Mainieri

Ricardo Mainieri disse...

Querida Márcia me empresta este miniconto pra postar no blog?
Divulguei ele no twitter, tb.

Beijão.

Ricardo Mainieri

Sofia Fada disse...

adorei esse miniconto e o blog, parabéns!
Sofia

Manuel Veiga disse...

e o "sapo" se fez principe encantado!

excelente.

beijos