quarta-feira, 31 de outubro de 2012

em noite de bruxas


sou faca 
de aço cristal ou prata 
navalha de fogo 
sou morte sou grito 
sou gozo 

em noite de bruxas 
sou apenas eu 

(e isso me encanta e basta)



Márcia Maia 


domingo, 21 de outubro de 2012

Sonhando com Cavaleiros


antónio manuel pinto da silva©














Sonhava com cavaleiros. Andantes. Armaduras de prata ao luar. Galantes. E limpos. Essencialmente limpos. Olhos negros. Pele morena, de preferência. Não era muito chegada a louros e olhos azuis. E aí começava o problema de seus sonhos. A falta de coerência. Onde, na corte do rei Arthur ou na Bretanha de Ivanhoé, caberiam cavaleiros morenos? Longos cabelos negros. Nem tão lisos assim. Barbas cerradas. Grandes e profundos olhos negros. Mãos de longos dedos. Fortes. E, ainda por cima, limpos! Estes povoavam sua imaginação e a deixavam à beira de um ataque de nervos. De tesão. Mas, com essa descrição, jamais seriam seus cavaleiros, os heróis. Estavam mais para bandidos, infiéis, ladrões. O que poderia ser facilmente constatado em qualquer filme de quinta ou numa mera revista em quadrinhos. E ela, a princesa encastelada, como poderia amá-los? Passava tardes inteiras sonhando em busca de uma solução. E nada encontrava que se adequasse ao espírito dos romances e filmes dos tempos de adolescente. Tentava se imaginar nos braços de um deus louro, barba fininha, cílios dourados emoldurando olhos azuis, límpidos como a água do mar. Ou o céu da tarde. Tão bravo e gentil. E babaca, pensava. Não lhe inspirava em nada.O menor estremecimento. A mais remota emoção. Desistiu. Decidiu subverter o enredo. E passou a dedicar-se, com afinco, às aventuras com os, digamos, forasteiros. Nos seus sonhos, era raptada e o mais alto, mais moreno, de maiores e mais profundos olhos negros, barba mais cerrada, caía de paixão por ela. Imaginava tórridas cenas, mais para Nove e Meia Semanas de Amor que para Camelot. E era feliz. Atrapalhada e deliciosamente feliz, na mais louca e incongruente aventura. Onde a princesa morria de tesão pelo galã, que não era nem louro, nem herói. E onde os louros cavaleiros, como bem lhes cabia, lutavam até a morte pra libertá-la. Mas, para a glória eterna de seus nomes, convenientemente, morriam. 



 Márcia Maia